quinta-feira, 14 de junho de 2012

Memória seletiva por Fernanda Carvalho

Milton Marques. O esquecimento é destruir, não construir. 2011
Lata de biscoito, circuito elétrico e areia. 12x18,7cm

Quando me deparei com a obra “O esquecimento é destruir, não construir” de Milton Marques, pensei imediatamente no tempo, revelado sob a forma de uma diferente ampulheta, que ao mesmo tempo em que registra, apaga. Como numa dança, de incontáveis ciclos.
O tempo... tema que me fascina e intriga desde sempre, ou pelo menos, desdequando eu possa me lembrar.  Nessa obra, pude ouvir com os olhos o ruir do tempo. Que mesmo com toda sua violência e urgência, não existe. É uma ilusão.
A eternidade de um segundo... Um momento. Minutos intermináveis... vidas... dias que não passam... Um prisioneiro. Memória. Memória que me falha agora e memória que não me deixa em paz. A relatividade...do tempo. Minha obsessão metafísica e existencial. Nem passado, nem futuro, apenas o agora.
Uma circunferência e duas linhas. Um ponteiro é curvilíneo, o outro; carrega na extremidade um objeto que se assemelha a um círculo. A base? Uma caixa de biscoitos, contendo areia, que julgo uma escolha de extrema sensibilidade, pois nos remete aquela velha história de ‘apenas um grão (...)’, parte de um todo esquecido...a grandeza de ser pequeno, o um, o indivisível. A areia cobre a superfície circular, onde uma espécie de carimbo imprime ciclicamente a frase que é título da obra: “o esquecimento é destruir, não construir”, e assim a obra se se faz e refaz todo o tempo, como um relógio, onde a poesia se conserva e se desfaz como continuum. Um pouco mais de um minuto, e o ponteiro levou.
O homem e sua condição efêmera, de quem sabe que um dia vai embora, que um dia será apagado do mundo material, tal qual a frase na areia. A transformação. A ação do “tempo”. A mudança constante: a evolução.
Uma escultura. Talvez, um monumento!
Se o tempo existisse não passaríamos por ele, ele passaria por nós, o que passa por nós é a vida deixando suas marcas e nós, é claro, passamos pela vida, deixando nossas marcas. A lata velha fala das marcas que a vida deixa na gente.
A mesma rocha que hoje o sol beija, foi coberta pelas águas do mar.

Um comentário: