sábado, 26 de maio de 2012

A nova objetividade da arte tridimensional por Edna Galisa de Souza

                Compreender a arte tridimensional da atualidade parece-nos um grande desafio que, se vencido, nos leva a encontrar sentidos nas produções estéticas dos sujeitos envolvidos. A apreciação dessas produções pressupõe intuição, sensibilidade e, sobretudo, reflexão sobre as novas e diferentes relações entre objeto, espaço, tempo e cor que constroem a qualidade e o interesse de um trabalho.
            Na busca desse entendimento deparamo-nos com as considerações de Donald Judd (1965) sobre os trabalhos dos jovens artistas de sua geração, inscritos no espaço real, anti-ilusionista e não gestual, nos quais a cor, a forma e a superfície estão integradas. Parece-nos importante a ideia do artista de que as contradições à pintura e à escultura tradicionais são motivadas simplesmente por algum desconforto e por isso repercute mais intolerante do que realmente é.  Assim é que Judd afirma:
Um novo trabalho sempre envolve objeções ao velho, mas essas objeções só são verdadeiramente relevantes para o novo. Se o trabalho anterior é de primeira linha ele é completo. Novas inconsistências e limitações não são retroativas; elas concernem unicamente ao trabalho que está sendo desenvolvido. (1965, p.97).
            Para JUDD a diferença mais evidente nos novos trabalhos é que eles são abertos e em extensão, mais ou menos, ambiental, e por esse motivo são mais vastos que a pintura e a escultura. Por essa mesma razão, os problemas do ilusionismo, do espaço literal, do espaço dentro e em torno dos limites e das cores, que ocorrem com a pintura, são eliminados. O espaço real proporcionado pelo uso das três dimensões torna possível qualquer objeto, seja esse regular ou irregular, relacionado com a parede, o teto, o chão, o exterior, a paisagem, ou encerrar-se em si mesmo, sem qualquer afinidade com o meio.
Observamos, também, a utilização direta de todo tipos de materiais, específicos e enfáticos, objetivos na sua inexorável identidade, tais como fórmica, alumínio, latão, acrílico, lâmina de aço, ferro, bronze, prata, ouro e cristais, para citar alguns. Há ainda a qualidade dos materiais considerada para uso não objetivo, dependente da intenção; materiais rígidos, maleáveis, espessos, macios, reflexivos, translúcidos e opacos. Por vezes, esses materiais não se identificam obviamente com a arte. A obra e seus materiais estão interligados numa nova perspectiva e objetividade.
Mas para Hélio Oiticica, ao lançar o Manifesto Esquema Geral da Nova Objetividade [1], a ideia de objetividade assume um caráter mais amplo, vai além das três dimensões do nosso espaço real:
               A Nova Objetividade é a formulação de um estado típico da arte brasileira atual cujas principais características são: 1 – vontade construtiva geral; 2 – tendência para o objeto ao ser negado e superado o quadro do cavalete; 3 – a participação do espectador (corporal, táctil, visual, semântica, etc.); 4 – a abordagem e tomada de posição em relação a problemas políticos, sociais e éticos; 5 – tendência para proposições coletivas e consequente abolição dos “ismos” característicos da primeira metade do século na arte de hoje (tendência esta que pode ser englobada no conceito de “arte pós-moderna” de Mário Pedrosa); 6 – ressurgimento e novas formulações do conceito de antiarte. (1986, p. 84)
                Decorridos 45 anos da primeira divulgação do Manifesto, parece-nos irresistível averiguar se as características esquematizadas por Oiticica, algumas colocadas como tendência, se confirmaram nessa primeira década do Século XXI.
 A vontade construtiva geral de procurar nossas características latentes, a nosso ver, persiste, embora a esperada identidade cultural, ou seja, a arte contemporânea brasileira ainda é assunto de discussão por parte de artistas, críticos e acadêmicos. Sobre o tema não há consenso.
A segunda característica não se confirmou plenamente, pois o quadro de cavalete não foi inteiramente superado ou demolido. Verificamos que no mercado de artes ainda encontramos produções de artistas que guardam alguns dos elementos do quadro, como, por exemplo, os trabalhos de Cristina Oiticica, Gustavo Rosa, Glênio, Ziraldo, etc.
Quanto às demais características, acreditamos que se confirmaram, pois, a participação do espectador é cada vez mais presente nos trabalhos dos artistas contemporâneos; a preocupação com as questões sociais, políticas e éticas fortaleceu-se em função da liberdade ideológica hoje existente, embora essas questões nem sempre estejam adstritas à situação brasileira.
O autor conclui que no Brasil, para ter uma posição significativa é necessário ser visceralmente contra tudo que seria o conformismo cultural, político, ético e social. A frase fundamental para o seu grupo de vanguarda era: “DA ADVERSIDADE VIVEMOS!”.
 As ideias de Oiticica até hoje reverberam com força no mundo da arte brasileira, só que a frase mais adequada à nossa realidade seria: “VIVEMOS DA DIVERSIDADE!”. 

Referência
OITICICA, Hélio - Esquema Geral da Nova Objetividade, texto publicado no Livro Aspiro ao Grande Labirinto . Editora Rocco, 1986
JUDD, Donald - Objetos Específicos, texto publicado originalmente em Arts Yearbook 8, 1965, com numerosas reedições.
           
Edna Galisa de Souza
Estudante de Artes Visuais da Faculdade de Artes Dulcina de Morais.
Abril/2012


[1] O manifesto Esquema Geral da Nova Objetividade foi publicado originalmente na Exposição Nova Objetividade Brasileira, em 1967.

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