sexta-feira, 24 de maio de 2013

"Escuto histórias de Amor" de Ana Teixeira por Edna Galisa

Título: “Escuto histórias de amor”
Descrição: Ação realizada entre os anos de 2005 e 2012 em nove países: Alemanha, Itália, Espanha, França, Chile, Canadá, Brasil, Portugal e Dinamarca. Em lugares públicos de cada cidade (o centro de São Paulo, o Jardin des Touleries em Paris, La Rambla em Barcelona...) a artista sentou-se tendo ao seu lado um cartaz que anunciava no idioma local "Escuto histórias de amor". Enquanto tricotava uma lã vermelha, Ana esperava por pessoas que quisessem lhe contar uma história. As ações foram registradas em mídia digital e uma vídeo-instalação com os filmes de seis países foram exibidas em Toronto, no Canadá, em junho de 2008, no Mercer Union, Centre for Contemporary Art. A reação das pessoas foi variada e em alguns lugares ninguém falou com ela. Em outros, ela escutou muitas histórias diferentes.Os filmes não têm som e a vídeo instalação conta com um som único, editado com vozes em diferentes línguas e outros ruídos cotidianos dos espaços públicos. As histórias de amor não podem ser ouvidas. Ficam guardadas no barulho das ruas e na trama do tricô vermelho.


 Ana desenha, fotografa, produz vídeo e instalações, mas o foco principal de seu trabalho está em urdir relações humanas, ainda que aleatórias, por intermédio da arte de modo a transpor os limites do convívio habitual entre as pessoas. A subjetividade é o objeto de sua extensa  pesquisa, realizada em meio e por meio de suas obras.  
            As ações de rua empreendidas pela artista são recipientes de sonhos, desejos, palavras, histórias de vida e de amor e impressões digitais de milhares de pessoas de diversas nacionalidades. O seu trabalho põe do avesso, de forma poética ou melancólica, a realidade de muitas vidas comuns e anônimas. Leva-as a refletir sobre suas relações com o mundo que as circunda.
A obra “Escuto histórias de amor” é o exemplo mais simples e direto da proposta da artista. É fácil compreender o desenvolvimento da ação. No entanto, ela é rica de possibilidades e complexa pelas incertezas, desconfianças, temporalidade e aleatoriedade que produz.
 O trabalho de Ana faz parte da arte denominada por Nicolas Borriaud (2009), de estética relacional, na qual a arte “toma como horizonte teórico a esfera das interações sociais, mais do que a afirmação de um espaço simbólico autônomo e privado”. De fato, a rua é o espaço público onde se desenvolve a ação da artista, este espaço exterior que abriga o espaço interior das pessoas e no interregno destes espaços surge a arte de Ana Teixeira, nessa lúdica zona intermediária, o “interstício social”, com convite por escrito para um “dedo de prosa” e ao uso luxuoso do tempo para rememorar e soprar as brasas do amores vividos ou sonhados.
A estética relacional criada pela artista nessa obra é fundamental para seduzir os transeuntes. Em primeiro lugar o cenário montado pela artista. Em todos os lugares ela criou um “dispositivo relacional com certo grau de aleatoriedade”, (BORRIAUD, 2009, p.42) um nicho intimista, representado pelos banquinhos (dela e do “confidente”).  Um banquinho de lona ou qualquer outro material flexível, não rígido, não duro, sem braços que possam parecer “agarrar” o interlocutor. Um banquinho que visualmente parece disposto a liberar o contador de histórias a qualquer momento.
Depois, temos o cartaz contendo o convite indeterminado, mas carregando em si a disponibilidade da ouvinte, uma possibilidade.  O cartaz elaborado de forma simples, sem imagens direcionadoras ou indicativas de qualquer contexto cultural encerra em si mesmo a ponte de comunicação da artista com o outro.
E por fim temos o cachecol sendo tricotado calmamente pela artista, revelando sua disponibilidade de tempo e atitude para ouvir. Ou seja, a artista reuniu casualmente signos e formas de modo a gerar um ponto de encontro de fala BORRIAUD, com sua própria temporalidade, cujo resultado é o próprio trabalho ou o trabalho que virá.
 Não importam as histórias, nunca saberemos quais foram as mais belas, as mais emocionantes, as mais felizes. Mas podemos pressentir que todas as histórias que foram contadas à Ana (re) apresentaram ao seu narrador as emoções vivificadas por intermédio de sua verbalização. Mais interessante ainda é o fato de que a história foi contada ao mundo, mas ninguém a ouviu, pois muitas vezes contada em uma língua desconhecida pela artista ou abafada pelo barulho que soe acontecer em toda rua pública. A história de amor ficou no ar, acalentada e aquecida por um cachecol de lã vermelho, a cor do amor, da paixão, a cor vibrante de um sentimento maravilhosamente humano.


Edna Galisa de Souza, Estudante de Artes da Faculdade Dulcina de Moraes

REFERÊNCIAS

BORRIAUD, Nicolas. Estética Relacional. São  Paulo: Martins,2009.
Maio/2013 (mês das flores, das noivas e do amor)

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