Título: “Escuto
histórias de amor”
Descrição: Ação realizada entre os anos de 2005 e 2012 em
nove países: Alemanha, Itália, Espanha, França, Chile, Canadá, Brasil, Portugal
e Dinamarca. Em lugares públicos de cada cidade (o centro de São Paulo, o
Jardin des Touleries em Paris, La Rambla em Barcelona...) a artista sentou-se
tendo ao seu lado um cartaz que anunciava no idioma local "Escuto
histórias de amor". Enquanto tricotava uma lã vermelha, Ana esperava
por pessoas que quisessem lhe contar uma história. As ações foram registradas
em mídia digital e uma vídeo-instalação com os filmes de seis países foram
exibidas em Toronto, no Canadá, em junho de 2008, no Mercer Union, Centre for
Contemporary Art. A reação
das pessoas foi variada e em alguns lugares ninguém falou com ela. Em outros,
ela escutou muitas histórias diferentes.Os filmes não têm som e a vídeo
instalação conta com um som único, editado com vozes em diferentes línguas e
outros ruídos cotidianos dos espaços públicos. As histórias de amor não podem ser ouvidas. Ficam
guardadas no barulho das ruas e na trama do tricô vermelho.
Ana desenha, fotografa, produz vídeo e instalações, mas o foco principal de seu trabalho está em urdir relações humanas, ainda que aleatórias, por intermédio da arte de modo a transpor os limites do convívio habitual entre as pessoas. A subjetividade é o objeto de sua extensa pesquisa, realizada em meio e por meio de suas obras.
As ações de rua empreendidas pela artista são recipientes
de sonhos, desejos, palavras, histórias de vida e de amor e impressões digitais
de milhares de pessoas de diversas nacionalidades. O seu trabalho põe do avesso,
de forma poética ou melancólica, a realidade de muitas vidas comuns e anônimas.
Leva-as a refletir sobre suas relações com o mundo que as circunda.
A obra “Escuto
histórias de amor” é o exemplo mais simples e direto da proposta da artista. É
fácil compreender o desenvolvimento da ação. No entanto, ela é rica de
possibilidades e complexa pelas incertezas, desconfianças, temporalidade e
aleatoriedade que produz.
O trabalho de Ana faz parte da arte denominada
por Nicolas Borriaud (2009), de estética relacional, na qual a arte “toma como
horizonte teórico a esfera das interações sociais, mais do que a afirmação de
um espaço simbólico autônomo e privado”. De fato, a rua é o espaço público onde
se desenvolve a ação da artista, este espaço exterior que abriga o espaço
interior das pessoas e no interregno destes espaços surge a arte de Ana
Teixeira, nessa lúdica zona intermediária, o “interstício social”, com convite
por escrito para um “dedo de prosa” e ao uso luxuoso do tempo para rememorar e
soprar as brasas do amores vividos ou sonhados.
A estética relacional
criada pela artista nessa obra é fundamental para seduzir os transeuntes. Em
primeiro lugar o cenário montado pela artista. Em todos os lugares ela criou um
“dispositivo relacional com certo grau de aleatoriedade”, (BORRIAUD, 2009, p.42)
um nicho intimista, representado pelos banquinhos (dela e do
“confidente”). Um banquinho de lona ou qualquer
outro material flexível, não rígido, não duro, sem braços que possam parecer
“agarrar” o interlocutor. Um banquinho que visualmente parece disposto a
liberar o contador de histórias a qualquer momento.
Depois, temos o cartaz
contendo o convite indeterminado, mas carregando em si a disponibilidade da
ouvinte, uma possibilidade. O cartaz elaborado
de forma simples, sem imagens direcionadoras ou indicativas de qualquer
contexto cultural encerra em si mesmo a ponte de comunicação da artista com o
outro.
E por fim temos o
cachecol sendo tricotado calmamente pela artista, revelando sua disponibilidade
de tempo e atitude para ouvir. Ou seja, a artista reuniu casualmente signos e
formas de modo a gerar um ponto de encontro de fala BORRIAUD, com sua própria
temporalidade, cujo resultado é o próprio trabalho ou o trabalho que virá.
Não importam as histórias, nunca saberemos
quais foram as mais belas, as mais emocionantes, as mais felizes. Mas podemos
pressentir que todas as histórias que foram contadas à Ana (re) apresentaram ao
seu narrador as emoções vivificadas por intermédio de sua verbalização. Mais
interessante ainda é o fato de que a história foi contada ao mundo, mas ninguém
a ouviu, pois muitas vezes contada em uma língua desconhecida pela artista ou
abafada pelo barulho que soe acontecer em toda rua pública. A história de amor
ficou no ar, acalentada e aquecida por um cachecol de lã vermelho, a cor do
amor, da paixão, a cor vibrante de um sentimento maravilhosamente humano.
Edna Galisa de Souza, Estudante de Artes da Faculdade Dulcina de Moraes
REFERÊNCIAS
BORRIAUD, Nicolas.
Estética Relacional. São Paulo:
Martins,2009.
Maio/2013 (mês
das flores, das noivas e do amor)
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